terça-feira, 15 de setembro de 2009

INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 4 DE 08.09.2009 - DOU 09.09.2009 (Ministério do Meio Ambiente)

O MINISTRO DE ESTADO DO MEIO AMBIENTE, no uso das atribuições que lhe confere o art. 87, parágrafo único, inciso II, da Constituição, e tendo em vista o disposto nos arts. 16, § 2º e 19, da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, e
Considerando a necessidade de estabelecer procedimentos técnicos para a utilização sustentável da vegetação existente nas áreas de Reserva Legal, resolve:
CAPÍTULO I
- DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Para a utilização da vegetação da Reserva Legal, de que trata o § 2º, do art. 16 da Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, serão adotados procedimentos técnicos para execução do Manejo Florestal Sustentável, observando-se o disposto nesta Instrução Normativa.
Parágrafo único. No caso de Reserva Legal situada nos remanescentes de vegetação nativa na área de aplicação da Lei nº 11.428, de 21 de dezembro de 2006, observar-se-á o disposto nesta Instrução Normativa e no Decreto nº 6.660, de 21 de novembro de 2008.
Art. 2º Para a utilização da vegetação da Reserva Legal, serão adotadas práticas de exploração seletiva que atendam ao manejo sustentável nas seguintes modalidades:
I - manejo sustentável da Reserva Legal para a exploração florestal eventual, sem propósito comercial direto ou indireto, para consumo nas propriedades do agricultor familiar, do empreendedor familiar rural e dos povos e comunidades tradicionais; e
II - manejo sustentável da Reserva Legal para exploração com finalidade comercial.
Art. 3º Para os fins do disposto nesta Instrução Normativa, consideram-se:
I - Manejo da Reserva Legal: técnicas de condução, exploração e reposição praticadas de forma sustentável visando manter a proteção e o uso sustentável da vegetação nativa e obter benefícios econômicos, sociais e ambientais, respeitando-se os mecanismos de sustentação do ecossistema objeto do manejo e considerando-se, cumulativa ou alternativamente, a utilização de múltiplos produtos e subprodutos, bem como a utilização de outros bens e serviços ambientais;
II - Plano de Manejo Sustentável-PMS: instrumento técnico de administração das atividades desenvolvidas na unidade de manejo florestal;
III - Plano Operacional Anual-POA: Documento a ser apresentado ao órgão ambiental competente, contendo as informações definidas em suas diretrizes técnicas, com a especificação das atividades a serem realizadas no período de 12 meses.
IV - Unidade de Manejo: perímetro definido a partir de critérios técnicos, socioculturais, econômicos e ambientais, objeto de um PMS;
V - Produtos Florestais: produtos madeireiros e não madeireiros gerados pelo manejo sustentável; e
VI - Sistema Agro Florestal-SAF: Sistema de uso e ocupação do solo em que plantas lenhosas perenes são manejadas em associação com plantas herbáceas, arbustivas, arbóreas, culturas agrícolas, forrageiras em uma mesma unidade de manejo, de acordo com arranjo espacial e temporal, com alta diversidade de espécies e interações entre estes componentes.
CAPÍTULO II
- DA EXPLORAÇÃO EVENTUAL SEM PROPÓSITO COMERCIAL
Art. 4º A exploração florestal eventual, sem propósito comercial direto ou indireto, para consumo na propriedade ou posse do agricultor familiar, do empreendedor familiar rural e dos povos e comunidades tradicionais, incluindo a área de Reserva Legal, independe de autorização dos órgãos competentes, quando tratar-se de:
I - lenha para uso doméstico no limite de retirada não superior a quinze metros cúbicos por ano por propriedade ou posse; e
II - madeira para construção de benfeitorias e utensílios na posse ou propriedade rural até 20 metros cúbicos a cada três anos.
Parágrafo único. Os limites para a exploração prevista no caput deste artigo, no caso de posse coletiva de populações tradicionais ou do agricultor familiar, serão adotados por unidade familiar.
Art. 5º O transporte de produtos e subprodutos florestais madeireiros provenientes da exploração eventual, além dos limites da posse ou propriedade rural, para fins de beneficiamento, deverá ser acompanhado da autorização de transporte especifica emitida pelo órgão ambiental competente, contendo:
I - dados de volume individual e total por espécie, previamente identificadas e numeradas;
II - justificativa de utilização e descrição dos subprodutos a serem gerados;
III - indicação do responsável pelo beneficiamento dos produtos; e
IV - indicação do responsável pelo transporte dos produtos e subprodutos gerados, bem como do trajeto a ser percorrido.
CAPÍTULO III
- DA COLETA DE SUBPRODUTOS FLORESTAIS E ATIVIDADES DE USO INDIRETO
Art. 6º É livre a coleta de subprodutos florestais, tais como frutos, folhas e sementes, devendo-se observar:
I - os períodos de coleta e volumes fixados em regulamentos específicos, quando houver;
II - a época de maturação dos frutos e sementes;
III - técnicas que não coloquem em risco a sobrevivência de indivíduos e da espécie coletada no caso de coleta de flores, folhas, cascas, óleos, resinas, cipós, bulbos, bambus e raízes, e
IV - as limitações legais específicas e, em particular, as relativas ao acesso ao patrimônio genético, à proteção e ao acesso ao conhecimento tradicional associado e de biossegurança, quando houver.
Art. 7º Consideram-se de uso indireto, não necessitando de autorização dos órgãos ambientais competentes, as seguintes atividades realizadas em área de Reserva Legal:
I - abertura de pequenas vias de acesso interno e suas pontes e pontilhões, quando necessárias à travessia de um curso de água, ou à retirada de produtos oriundos das atividades de manejo agroflorestal sustentável praticado na propriedade ou posse do agricultor familiar, do empreendedor familiar rural e dos povos e comunidades tradicionais;
II - implantação de trilhas para desenvolvimento de ecoturismo;
III - implantação de aceiros para prevenção e combate a incêndios florestais;
IV - implantação de instalações necessárias à captação e condução de água e efluentes tratados, desde que comprovada a outorga do direito de uso da água, quando couber;
V - implantação de corredor de acesso de pessoas e animais para obtenção de água;
VI - construção de rampa de lançamento de barcos e pequeno ancoradouro;
VII - coleta de produtos não madeireiros para fins de manutenção da família e produção de mudas, como sementes, castanhas e frutos, desde que eventual e respeitada a legislação específica do acesso a recursos genéticos;
VIII - plantio de espécies nativas produtoras de frutos, sementes, castanhas e outros produtos vegetais em áreas alteradas, plantados junto ou de modo misto;
IX - construção e manutenção de cercas ou picadas de divisa de propriedades; e
X - pastoreio extensivo tradicional em campos naturais desde que não promova a supressão da vegetação nativa ou a introdução de espécies vegetais exóticas.
XI - outras ações ou atividades similares, reconhecidas pelo CONAMA como eventual.
CAPÍTULO IV
- DIRETRIZES E ORIENTAÇÕES PARA O MANEJO FLORESTAL NA RESERVA LEGAL
Art. 8º O manejo florestal sustentável da vegetação da Reserva Legal, com propósito comercial direto ou indireto, de espécies da flora nativa provenientes de formações naturais, que não descaracterize a cobertura vegetal e não prejudique a função ambiental da área, deverá atender as seguintes diretrizes e orientações:
I - adoção de práticas silviculturais e medidas para a minimização dos impactos sobre os indivíduos jovens das espécies arbóreas secundárias e climácicas na área manejada;
II - a priorização do corte de espécies arbóreas pioneiras nativas, que não poderá ultrapassar a cinquenta por cento do número de indivíduos de cada espécie explorada existentes na área manejada;
III - o cálculo do percentual previsto no inciso II deverá levar em consideração somente os indivíduos com Diâmetro na Altura do Peito-DAP acima de cinco centímetros;
IV - o manejo sustentável da Reserva Legal que tenha sido constituída com plantios de árvores frutíferas, ornamentais ou industriais, compostas por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas, deverá priorizar o corte destas espécies exóticas, num ciclo que resguarde a função ambiental da área;
V - na condução do manejo de espécies exóticas deverão ser adotadas medidas que favoreçam a regeneração de espécies nativas.
Art. 9º Na propriedade ou posse do agricultor familiar, do empreendedor familiar rural e dos povos e comunidades tradicionais o manejo florestal madeireiro sustentável da Reserva Legal com propósito comercial direto ou indireto depende de autorização do órgão ambiental competente, devendo o interessado apresentar, no mínimo, as seguintes informações:
I - dados do proprietário ou possuidor;
II - dados da propriedade ou posse, incluindo cópia da matrícula do imóvel no Registro Geral do Cartório de Registro de Imóveis, ou comprovante de posse;
III - croqui da área com indicação da área a ser objeto do manejo seletivo;
IV - comprovação da averbação da Reserva Legal; e
V - Laudo Técnico, com respectiva Anotação de Responsabilidade Técnica, contendo, no mínimo, inventário fitossociológico da área a ser manejada com a indicação da fitofisionomia original, elaborado com metodologia e suficiência amostral adequadas; estimativa do volume de produtos e subprodutos florestais a serem obtidos com o manejo seletivo, indicação da sua destinação e cronograma de execução previsto.
§ 1º O Laudo Técnico mencionado no inciso V deverá ainda atestar a viabilidade do manejo proposto, considerando os volumes de produtos e subprodutos florestais a serem explorados, com a necessária manutenção das funções ambientais da área manejada.
Art. 10. Nas demais propriedades, não mencionadas no art. 9º desta Instrução Normativa, a autorização do órgão ambiental competente será precedida da apresentação e aprovação do Plano de Manejo Sustentável-PMS, contendo:
I - dados sobre proprietário, empresa ou responsável pela área;
II - dados da propriedade ou posse, incluindo cópia da matrícula do imóvel no Registro Geral do Cartório de Registro de Imóveis, ou comprovante de posse;
III - dados sobre o responsável técnico pelo PMS;
IV - localização georreferenciada do imóvel, e indicação das áreas de preservação permanente, reserva legal e uso alternativo do solo;
V - mapeamento das unidades de manejo e malha de acesso descrito em modulo de escala compatível;
VI - caracterização do meio físico e biológico da reserva legal e da unidade de manejo, incluindo descrição hidrográfica;
VII - descrição do estoque dos produtos madeireiros e não madeireiros, a serem extraídos na Unidade de Manejo da área objeto do PMS, por meio do Inventário Florestal amostral;
VIII - ciclo de corte compatível com as diretrizes gerais e com o tempo de restabelecimento do volume ou quantidade de cada produto ou subproduto a ser extraído da unidade de manejo;
IX - cronograma de execução do manejo previsto;
X - descrição das medidas adotadas para promoção da regeneração natural das espécies exploradas na unidade de manejo; e
XI - descrição do sistema de transporte adequado e da construção de vias de acesso com métodos e traçados que causem o menor impacto.
§ 1º Anualmente, o proprietário ou responsável pelo PMS, encaminhará formulário especifico, ao órgão ambiental competente, contendo o relatório assinado pelo responsável técnico, com as informações sobre toda a área de manejo florestal sustentável, a descrição das atividades realizadas e o volume efetivamente explorado de cada produto no período anterior de doze meses;
§ 2º O proprietário ou responsável pelo PMS submeterá ao órgão ambiental competente o formulário especifico acompanhado do Plano Operacional Anual, e a Autorização de Responsabilidade Técnica-ART, com a especificação das atividades a serem realizadas no período de doze meses e do volume ou quantidade máxima proposta para a exploração no período.
CAPÍTULO V
- DISPOSIÇÕES TRANSITORIAS
Art. 11. A área de Reserva Legal excedente destinada a constituição de cotas de reserva florestal, prevista do no Art. 44-B, do Código Florestal, terá o mesmo regime de exploração prevista nesta Instrução Normativa, observados os contratos de serviços entre proprietários e portadores dos títulos de Cota de Reserva Florestal-CRF.
Art. 12. Os formulários contendo os modelos de elaboração, apresentação, execução e avaliação técnica do PMS e Plano Operacional Anual-POA observarão modelo especifico emitido pelo órgão ambiental competente.
Art. 13. Para os fins do disposto nesta Instrução Normativa, ressalvado normatização específica, é vedada a exploração de espécies incluídas na Lista Oficial de Espécies da Flora Brasileira Ameaçadas de Extinção ou constantes de listas dos Estados, bem como aquelas constantes de listas de proibição de corte objeto de proteção por atos normativos dos entes federativos.
Art. 14. O manejo sustentável de Reserva Legal será submetido a vistorias técnicas para acompanhar e controlar rotineiramente as operações e atividades desenvolvidas na área de manejo.
Art. 15. As pessoas físicas ou jurídicas que utilizarem matéria-prima florestal proveniente da área de manejo de Reserva Legal, excetuado as modalidades previstas nos arts. 5º e 6º desta Instrução Normativa, são obrigadas a comprovar a origem dos produtos florestais conforme previsto na Instrução Normativa nº 6, de 15 de dezembro de 2006, que dispõe sobre a reposição florestal e o consumo de matéria-prima florestal.
Art. 16. O transporte e armazenamento de produtos e subprodutos florestais madeireiros de origem nativa decorrentes da exploração em regime de manejo sustentável de Reserva Legal, deverão estar acompanhados de documento expedido pelo órgão ambiental competente e válido para todo o tempo da viagem ou do armazenamento.
Art. 17. Esta Instrução Normativa entra em vigor na data de sua publicação.
CARLOS MINC

Proprietário de área rural poderá explorar reserva legal


O proprietário de uma área rural poderá colher sementes, castanhas e frutos, pegar lenha para uso doméstico e usar madeira para construir benfeitorias dentro de sua reserva legal. Nessa área, também poderá fazer o manejo florestal sustentável, ou seja, cortar algumas árvores de forma alternada.

As medidas integram uma instrução normativa do Ministério do Meio Ambiente (MMA) que regula o uso sustentável das reservas legais localizadas dentro das propriedades rurais. Com as regras, o MMA quer dar uma resposta aos ruralistas, que reclamam da quantidade de áreas protegidas ambientalmente, sustentando que elas dificultam a sobrevivência dos produtores, principalmente dos pequenos.

Em geral, por lei, a reserva precisa ocupar 20% da área total da propriedade. Na Amazônia, porém, precisa ser de 80%.

"Já havia a previsão do uso sustentável da reserva legal no Código Florestal. Mas, na prática, ninguém conseguia utilizá-la e todos interpretavam a área como indisponível", afirma João de Deus Medeiros, diretor do Departamento de Florestas do MMA. Até multas eram dadas a quem utilizava a reserva.

Agora, a norma permite a abertura de trilhas para ecoturismo nas reservas, além de pequenas vias de acesso para retirada de produtos florestais. Mas a cobertura vegetal da área não pode ser descaracterizada nem sua função ambiental, prejudicada. A Área de Preservação Permanente (APP), como margens de rios e topos de morros, continua intocável.

A ação é uma tentativa de mostrar que não há necessidade de mudar radicalmente a legislação ambiental, tendo em vista a intenção de ruralistas de alterar o Código Florestal. Uns defendem até a sua revogação.

De acordo com Medeiros, muitas dificuldades apresentadas pelo setor rural não são problemas do Código Florestal, mas, sim, da falta de regulamentação. O diretor afirma que a instrução normativa publicada na quarta-feira passada no Diário Oficial da União é "fruto de consenso com diferentes movimentos" da sociedade.

O Ministério da Agricultura, no entanto, parece não ter entrado nesse consenso. A pasta considera que a medida atende mais aos pequenos produtores e não resolve as dificuldades dos médios e grandes.

Na opinião de Raul do Valle, coordenador adjunto do programa de Política e Direito do Instituto Socioambiental (ISA), a regulamentação do uso sustentável das reservas "desmistifica a ideia de que o Código emperra tudo e engessa o uso rural". "Havia uma desinformação muito grande. Algumas pessoas achavam até que a reserva pertencia ao Ibama", diz.

Valle considera que, com o uso da reserva legal, os produtores vão "se apropriar da área e cuidar dela". "A área podia pegar fogo que o proprietário não se importava", afirma.

Para ele, o uso da reserva pode incentivar os proprietários a recuperarem as reservas que sofreram degradação. Ele também defende um incentivo econômico para quem recuperar a reserva e a APP. Uma solução, por exemplo, seria abater parte da dívida de produtores que utilizaram crédito rural.A Associação Brasileira de Agribusiness (Abag) foi procurada pela reportagem, mas não respondeu.